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Lembranças

19 maio

Aquilo tinha tudo para dar errado.

Um grupo de batedores, pequeno, aproximava-se da fortaleza. A noite avançava vermelha – tudo naquele lugar tinha, para Akane, algo de vermelho – e tudo o que eles tinham que fazer era conseguir informações o suficiente para que pudessem preparar um ataque. Aquele forte tinha que ser tomado.
Os cabelos alaranjados emolduravam o rosto tenso da guerreira, que se aproximava entre as árvores o mais silenciosamente possível. Podia ouvir o leve roçar dos soldados que a acompanhavam. Ou talvez eles nem estivessem fazendo barulho de fato, talvez fosse apenas a tensão.

Medo. Era isso que sentia. Mas achava bom – não ter medo de demônios e diabos era algo de se estranhar. Na bainha, A Ladra das Nove Vidas parecia pulsar, como se pedisse por sangue. Para se sentir melhor, segurou a guarda conforme andava. Não ajudou.

– E o que fazemos agora?

Um sussurro a fez voltar para si. Era um dos homens. Akane encarou a muralha, procurando uma brecha, uma falha, qualquer coisa… até que viu. Era uma saída na muralha lateral, onde provavelmente eram eliminados os dejetos. Talvez ali eles não chamassem a atenção. É, talvez desse certo.

Com passos rápidos, o grupo se aproximou da muralha. Nada de errado. Uma forçada rápida na grade e a passagem estava aberta. A guerreira esperou que os outros chegassem, esperou que passassem e só então entrou no túnel.

A escuridão logo se apoderou da visão de Akane, que tropeçou um pouco até se encontrar. Os olhos se acostumaram aos poucos, e então ela pôde divisar os vultos dos homens. Tentou ignorar o cheiro, e apoiando-se nas paredes seguiu. Dez passos, quinze passos, e ela pôde divisar uma fraca luz adiante. Por um momento aquilo a animou, até que pôde ver que alguém trazia aquela iluminação.

Luz que se aproximava, ganhando forma e tamanho, e trazendo calor. A explosão repentina que se seguiu mal deu tempo para Akane esquivar-se com um salto rápido pára trás, levando apenas breves escoriações. Mas o cheiro de carne queimada, juntamente com os gritos dos outros, indicavam que eles não tiveram tanta sorte.

<- Achou que podia entrar aqui de maneira tão fácil, Estrangeira?> – a voz parecia ressoar por todos os lados. E logo em seguida uma escuridão quase palpável tomou conta do pequeno corredor. Como detestava magos. Prendeu a respiração por alguns segundos, o suficiente para deduzir a localização o conjurador pelo ruído dos seus passos.
<- Ao que parece, eu posso. Acha que esses truques baratos vão me impedir, arcano?>
<- Prove então dos seus artifícios de bárbaros, Forasteira.>

E então sentiu uma movimentação muito próxima. Por muito pouco desviou de um golpe de espada, e bolqueou outro com o escudo. Perder homens em uma missão de reconhecimento não tinha nada de anormal, mas ser morta por eles não parecia nada agradável. Movimentou-se para onde achava que era a saída, e por instinto desembanhou a espada.

Não soube se demorou demais a reagir, mas o fato é que não conseguiu explicar realmente o que aconteceu depois. A Ladra das Nove Vidas, sentindo-se liberta da bainha, parecia guiar os golpes. O primeiro foi aberto, e atingiu o soldado entre algumas costelas. Com o braço esquerdo, desviou um outro golpe que mal percebera, mas o movimento deixou o flanco esquerdo desprotegido. E então o terceiro soldado atacou-a, descendo a lâmina pela perna e encaixando-a exatamente na parte traseira da rótula.

O grito de dor e raiva incontida parece ter preenchido todo o forte, e ao invés de debilitar a guerreira, a dor pareceu excitá-la ainda mais. Fazendo a lâmina descrever um círculo, atingiu seu oponente na altura da bacia, fazendo-o cair de joelhos. O segundo golpe era desnecessário, mas nada a faria parar naquele momento. Como se soubesse exatamente o que fazer, retirou a espada já coberta de sangue e desceu a lâmina pouco acima da clavícula. O sangue espirrou-lhe no rosto, mas Akane não parecia se importar com isso.

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– E o que aconteceu depois? – perguntou o rapaz, impressionado. – Você devia ter perdido a perna, ou não ser capaz de mexê-la…
– Magias de cura fazem milagres, Colin. Mas eu não me lembro. Me deixei levar. – os olhos verdes da guerreira pareciam se arrepender de ter contado a história. – Eu disse que não seriam boas histórias.
– Não, não é isso. Mas é impressionante ouvir tudo o que aconteceu… E essa aqui? Como conseguiu?