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Eneida – Livro V – Uma Errata

26 mar

Nota da autora: Na verdade, essas são cenas foram cortadas do episódio anterior por motivos de força maior e esquecimento agudo.

Partindo de Drépano, sem mulheres, Enéias seguiu seu rumo. Segundo profecias escusas de Apollo, não mencionadas nesse relato graças a seu caráter duvidoso (se alguém conhecer algum oráculo que funcione como deveria, mande uma carta à redação), Enéias vagaria por mares e mares e mais mares até chegar à Itália, que não é assim tão longe da Ásia. Mas claro, para heróis as coisas devem ser mais difíceis.

Nem sempre, no entanto. Vênus1, cansada de ver seu filho sofrer, recorreu a Netuno2. Já que Júpiter5 não punha rédeas em sua mulher4, ela deveria usar as pernas que tinha. Pernas? Eu disse pernas? Eram armas, armas.

– Netuno… sabe, todos sabem que você é quem manda no mar, e eu estive pensando se você não poderia ajudar Enéias. Sabe como é, ele já viajou tanto… ele é um bom menino. Bem intencionado, conhece as tradições. Não é muito esperto, é bem verdade, mas é um bom rapaz.

– Vênus, você é a única que não pode reclamar da minha ajuda. Sabe aquela ilha em que você nasceu? Pois é, eu poderia afundá-la a qualquer momento. E durante a guerra de Tróia, eu salvei esse moleque de ser destroçado por Aquiles5. E naquele dia…

– Ora, eu conheço sua benevolência para comigo e com o meu filho. Mas será que não há nenhuma forma de negociarmos, então, uma viagem mais… rápida? A nossa noite, pelo contrário, pode demorar bastante.

Enéias não sabe como, mas sua viagem até a Itália dessa vez foi tranqüila. Não entendeu também o motivo de, assim que encontrou a profetisa que deveria guiar seu caminho a partir de então, ela encomendou rapidamente um sacrifício a Vênus. Em agradecimento.

MITOLOGIA FOR AQUELES QUE DON’T KNOW

  1. Vênus: Afrodite na mitologia romana. Sim, aquela gostosona, que desnudou os seios para ganhar um concurso de beleza. Cheater.
  2. Netuno: Poseidon. Sim, aquele dos Cavaleiros do Zodíaco, de cabelo azul e tridente. Deus dos mares e tempestades marítimas, casado com uma ninfa.
  3. Júpiter: Zeus. O manda-chuva. Aquele-que-atira-raios. Precisa de mais alguma coisa? Mulherengo.
  4. Sua mulher: Aqui se referindo a Juno, ou Hera. Aquela esposa ciumenta, que não tem mais nada pra fazer além de perturbar a vida do marido e dos outros. Uma chata.
  5. Aquiles: Herói da Ilíada, super macho-man, e como todo mito grego, era gilete. Bem que poderia ser um personagem de d&d americano: Matar, destruir e pilhar.

Enéias jogando o papo em cima de Dido, rainha de Cartago.

Peripécias Divinas – V

4 fev

Enxofre, gritos, sofrimento. Ele vislumbrava tudo do seu trono de ossos, acariciando uma das cabeças do seu cão Kérberus. Tudo corria normalmente – Tântalo continuava sua tentativa interminável de comer e beber, Sísifo rolava a pedra morro acima e morro abaixo… Nada de novo. Ele, no entanto, parecia preocupado.

– E com o que te preocupas?

Uma cópia muito mais generosa da Monica Belluchi andava provocante na sua direção. Ser um deus tinha suas vantagens, afinal. Ela usava o mesmo figurino do Matrix Revolutions, só que não parecia estar tão incomodada de usar uma roupa tão apertada. E tanto a saia, quanto a blusa, quanto qualquer outra coisa lhe caía bem. Nada como silicone de ambrosia.

– Esses malditos astrólogos! – explodiu finalmente o deus, seus cabelos inflamando em tons azulados – nunca gostou do vermelho que descreviam nas lendas. Levantou-se do trono, enquanto seu cão modestamente se retirou para comer um semi-deus incauto, que queria arrancar-lhe a coleira. – Eles querem me rebaixar! REBAIXAR, a mim!

– Querido, são astrônomos…

Ao fundo, os gemidos de Kérberus juntavam-se aos outros barulhos do reino: correntes, espadas, escudos, conversas sem nexo… O cachorro não era muito inteligente, mas não gostava quando a sua pretensa refeição se mexia. E pior: feria-o com uma espada mágica abençoada. Agora ele entendia o significado de vida de cão.

– Que seja. Eles acham que conhecem os segredos deste universo. Só porque criaram aqueles malditos conservatórios, que são na verdade antros de imoralidade e desrespeito! Ahn, como é mesmo o nome desses prédios? Prostíbulos?

– Não. Universidades.

– Bem, quase a mesma coisa. Quem eles pensam que são?

– Estudiosos, acho. – respondeu Perséfone, distraída, lixando as suas unhas.

Hades – ou Plutão, como queiram – sempre teve problemas de auto-estima, graças à parte que lhe coube cuidar. Nada contra os mortos, mas… bem, eles estão completamente mortos. Todos o temem, todos pensam que ele é um deus maligno e ausente de sentimentos… mas poucos se lembram que ele seqüestrou Perséfone, neta de Zeus, só por amor. E não foi bem um seqüestro…

– Estudiosos! Até parece! Eles esqueceram quem começou com os princípios dessa ciência supérflua deles? Aqueles que nos adoravam! Que matavam em nosso nome! Sabe, não nos chamamos deuses à toa! Qual o planeta que eles dão para Zeus? O maior deles! Júpiter! Mas para mim, Hades, eles dão o Planeta Anão!

– Bem, querido… quando ainda eram nove planetas, você era o nono, certo? – sem esperar resposta, a elegante deusa continuou. – Quantos são os círculos do inferno, segundo aquele escritor com o qual você toma chá toda tarde?

– Nove… mas onde você quer chegar?

– E qual o melhor livro dele?

– O Inferno…

A postura já ia mudando – parecia mais relaxado. É, era um escritor aclamado até mesmo por quem nunca tinha lido, e o seu melhor livro do conjunto de três, era mesmo o que descrevia os domínios de Hades. Hm, não estava tão mal na fita.

– Isso, bom garoto. Agora, me diga: qual dos maiores deuses tem uma esposa de curvas tão generosas quanto eu?

Peripécias Divinas – IV

5 out

– Bem, e o que fazemos agora?
– Não sei… já pensou em jogarmos xadrez?
– De novo? Não cansou de perder?

Atena, a deusa do conhecimento, sabedoria e justiça, suspirou frustrada. Sabe, esse papo todo de ser deus, de viajar léguas e léguas em segundos era muito legal no começo. Mas depois ia ficando entediante – assim como essa história de ficar se metendo na vida dos mortais, influenciando guerras, se envolvendo com outros deuses…

– E então? Vai ou não?
– Tá, eu jogo com as brancas.

Apollo, o deus sol, se levantou contente da vida para pegar as peças de xadrez. Irmão por parte de pai de Atena, nunca entendeu as manias da irmã – essa coisa toda de se disfarçar entre os mortais, ficar sussurrando conselhos para os outros, e todos esses hábitos estranhos. Colocou as peças do seu jogo de xadrez divino à divina mesa, e falou:

– Comece.

E Atena move o cavalo, iniciando o fatídico cheque-mate. Pela bilionésima vez.

**********

Enquanto isso…. *fala aquela voz do além que só aparece nessa hora*

– A guerra está perdida! O que vamos fazer, Ulisses?!

Ulisses, orando para a sua idolatrada e sensata deusa, implora por uma sábia iluminação, para que assim ele possa guiar seus homens a uma vitoriosa empreitada.

– Ó, Atena, a mais sensata entre os deuses, filha do grandioso Zeus, ouça minhas preces, e ilumine com tua sapiência este pobre mortal que vos fala.

E em sua mente, soam as sábias palavras:

– O cavalo…. isso, o cavalo… as peças de madeira…

E então surgiu a idéia do cavalo de Tróia.

**********

– Hah! Cheque-mate! De novo, Apollo. E com um cavalo! Quando você vai desistir, hã?

Peripécias Divinas – III

5 out

Afrodite lixava as unhas displicentemente, mais para passar o tempo do que qualquer outra coisa. Tédio. Como a mais bela das deusas, com suas longas madeixas cascateando loiras pela fina cintura, não tinha o que fazer em uma tarde de sábado? Aquilo era imperdoável!

Soltou um suspiro que refletia a inanição. Não, aquilo não ficaria assim. Sim, Zeus poderia ser o senhor dos trovões, mas aquilo não dava-lhe o direito de obrigá-la a casar-se com o coxo ferreiro Hefesto. Bem, que se danassem! Não esperavam que ela ficasse ali como boa esposa, não é mesmo?

Tomou um banho de sais, e ungida com seus oléos de cheiros capazes de fazer um batalhão cair de amores, escolheu o melhor vestido – e o de maior decote, obviamente – e saiu.

Não demorou muito para que encontrasse uma distração para as tardes – e para as solitárias noites, também. Ares, o senhor das guerras, dotado de grande força e beleza, e completamente desprovido de inteligência – o que não era realmente um defeito, dado os propósitos da deusa. Homens inteligentes demais costumavam contrariá-la. E aquilo não era agradável.

– Acabei de saber que seu marido saiu, e vai viajar.
– Hum… – respondeu dando-lhe aquele olhar cujas legendas dizem: “E o que você está esperando, idiota?”

Sexo, ardente e selvagem. Os vizinhos ficaram assustados, pensando até que era um presságio maligno, ou coisas piores. O que os amantes não desconfiavam era que, o leito havia sido previamente forjado por Hefesto, que enlaçou os amantes como haviam vindo ao mundo. Atena baixou os olhos, ruborizada. Apollo não conseguia tirar os olhos de Afrodite, que estava estranhamente sexy enlaçada numa rede invisível.

Dias depois, o inevitável divórcio, com separação de bens. Afrodite encontrou um gigolô mortal de nome Adônis, que deu-lhes algumas noites de prazer e muitos prejuízos – e que morreu logo depois, em circunstâncias duvidosas. Ares continuou com as suas guerrinhas, diariamente vítima das chacotas nas tavernas divinas espalhadas pelo Olimpo e vizinhanças. Hefesto continuou forjando incansavelmente, fazendo um voto de castidade para si mesmo. Se acostumaria às noites no banheiro.

Peripécias Divinas – II

5 out

Atalanta sentou-se cansada, encostando-se sem delicadeza nenhuma em uma grande árvore, provavelmente centenária. Saciou a sede que queimava-lhe a garganta, e respirou fundo. É, até que o treino de hoje não tinha sido tão ruim. A pobre árvore, por sua vez, limitada por sua imobilidade, se perguntava porque diabos tinha escolhido trabalhar como uma árvore. Essa história de servir de encosto para qualquer um não era nem um pouco agradável. Sem contar com os cachorros, e outros animais que a usavam para coisas indevidas. Estava pensando seriamente em mudar de emprego. Talvez se fosse uma pedra… hum, será que ganharia alguma indenização por mais de cem anos de trabalho?

Preocupada demais em respirar e pensar ao mesmo tempo, Atalanta sequer podia sonhar que a árvore agora realizava cálculos astronômicos (afinal, é de conhecimento público que árvores são excelentes matemáticas). A heroína andrógina perdeu o fôlego por um momento quando ouviu passos se aproximando e tentava advinhar de quem seriam.

– Será que eles não se cansam nunca?
– Atalanta! – bradou um deles – Viemos aqui para que finalmente escolhas teu marido!
– Eu tinha esperança que vocês já tivessem desistido. Que parte do “Eu não quero me casar!” vocês não entenderam? Querem que eu desenhe?
– Hum, talvez o til…

Suspirou, mais desconsolada do que nunca. Será que eles não entendiam que ela não podia casar? Sim, um advinho qualquer havia predito um futuro tão horrível, mas tão horrível, caso ela chegasse a se casar, que seus pais nunca contaram. Além do mais, ela sempre foi meio esquisita mesmo… tinha um rosto masculino demais para ser uma mulher, e feminino demais para ser um homem. Ou seria o contrário? Bem, não importava. Tinha que se livrar daqueles pretendentes. E rápido.

– Tá, tudo bem. Façamos assim então: aquele que me vencer numa corrida, se casará comigo. Os perdedores, porém, serão brutalmente mortos. Quem se habilita?

Quando olhou novamente para os pretendentes, Atalanta percebeu que haviam diminuído bastante em número. Se apiedava de todos eles, mas bem, eles estavam se arriscando porque queriam.

E houve a corrida. E havia mais pessoas assistindo o sacrifício coletivo do que a corrida, o que era plenamente previsível naqueles tempos. Não que os homens não apreciassem os esportes, mas ver pessoas agonizando sem motivo aparente era sem dúvida mais interessante. Essa mórbida curiosidade humana, que nos motiva a andar bem devagar quando passamos de carro perto de um acidente.

– Por que te vanglorias por vencer esses patifes? Ofereço-me para a disputa.

Lentamente, Atalanta levantou os olhos, visualizando seu oponente dos pés à cabeça. Alto, forte, de madeixas loiras que caíam-lhe delicadamente pelos ombros, o rapaz esbanjava mocidade. E o pessoal dos efeitos especiais não esqueceu de dar um toque de brilho, a câmera lenta com os cabelos ao vento, e uma trilha sonora adequada. Um grande sentimento de pena cortou o coração da garota, preferindo que ele desistisse do seu desafio. Logo a multidão começou a agitar, e ela foi obrigada a aceitar.

O que ninguém sabia era que Hipômenes guardava truques em sua túnica. Três deles, na verdade. Três maçãs de ouro. E a corrida começou. Em pontos estratégicos, Hipômenes jogou as maçãs, distraindo Atalanta (embora todos acreditem que se ele tivesse jogado qualquer coisa, mesmo uma pedra, a tática teria funcionado do mesmo jeito). Na última delas, orou para Afrodite, que se apiedou do jovem e o fez vencer a corrida.

E durante a lua de mel Atalanta se perguntava porque não tinha casado antes. Tinha adorado conhecer as peripécias do sexo.

Afrodite, contudo, ficou ofendida, por não ter nem ao menos um sacrificiozinho de nada em troca. Nem um mísero carneiro! Foi chorar aos pés de Réia, mãe de Zeus, e esta, só para não ter que aturar Afrodite miando no pé no seu ouvido, transformou os dois num casal de leões (um leão e uma leoa, caso isso não tenha sido entendido). A pobre árvore, sem entender mais nada daquela história toda, continuou pobre, uma vez que o sindicato das árvores foi fechado por falta de mobilidade dos seus participantes.

Peripécias Divinas – I

5 out

– Isso lá são horas de chegar, Zeus?!

Se não fosse trágica, a cena seria cômica. Ou vice-versa. Zeus, senhor dos trovões, andava na ponta dos pés em direção à cama, enquanto a ciumenta Hera estava sentada no leito de pele curtida de carneiro, os cabelos presos numa toca, e uma massa verde cobrindo a pele do rosto. E você que pensava que era fácil manter a macia pele imortal das deusas?

– Querida, a assembléia durou mais do que eu achava que…
– E esse cheiro de vinho?! E essas manchas de batom na sua túnica?! Acha que consegue me enrolar, não é? Pois bem, nesse quarto você não dorme hoje!
– Hera, não é nada disso do que…
– Saia já daqui! Bem que meu pai disse, eu não deveria ter me casado com você! Com tantos deuses por aí, eu precisava ter me casado com o mais mulherengo deles!

Suspirou, vencido. “Ela deve estar de TPM”, pensou, enquanto andava por seu divino palácio, já sem sono. Pôs os dedos entre a farta cabeleira grisalha, que as mulheres achavam um charme, e se jogou no sofá revestido de couro. Nunca seria capaz de entender sua esposa – ela não queria casar? Pois bem, casados estavam! Ele fez a corte, deu todos os presentes, gastou uma fortuna com a melhor mansão do Olimpo… será que além disso ele teria que ser fiel, quando se tem uma imortalidade pela frente a ser vivida? Não se incomodaria que ela tivesse também seus casos à parte, desde que ela não fosse tão ciumenta.

– E o pior é que nem clamar para algum deus eu posso… porque mesmo que eu aceitei ser o líder desse panteão mesmo?
– Poder. Privilégios. Riquezas. Bem, e há também a comodidade de ser o líder de um bando de deuses idiotas.

A voz que soava como vidro quebrado era inconfundível, assim como o cheiro de enxofre. Será que nem mesmo um banho ele poderia tomar, antes de subir alguns degraus da geografia planar? Com seus pés em brasa, Hades adentrava ao palácio, deixando chamuscada a cara tapeçaria que havia sido um presente de casamento.

– E o que você quer dessa vez, hã? Não tenho nenhum dinheiro pra emprestar, o que implica que seus instrumentos de tortura terão que esperar mais um pouco para serem trocados.
– Não se preocupe – meus clientes já se acostumaram com o que tem à disposição. Sabe, eu os convenci de que essas novas tecnologias não são realmente dolorosas.
– Ah, compreendo.
– Na verdade, tudo o que eu quero é fazer-lhe uma proposta. Estou cansado dessa vida de condenar os mortos, de arrumar um trabalho para cada alma que me chega lá – você não imagina como é ter que ouvir os lamentos dos seus heróis por séculos!
– Sabe, aquela história toda de destino, carma. Você tinha que ficar com a parte suja do trabalho.
– Bobagem! E bem… eu também estou com outros problemas…
– Do tipo…?
– Hum, você sabe…

Uma pausa desconcertante, embaraçosa. Mesmo os deuses ficavam sem palavras às vezes. Ainda por cima se tratando de assuntos tão delicados quanto à intimidade sexual de um casal. Com toda a sua experiência no assunto, Zeus pôde entender as entrelinhas do pensamento do seu desgarrado irmão.

– E… sua esposa está reclamando disso, imagino.
– É. E… bem, eu acho na verdade que tudo isso é conseqüência do stress. Nessa guerra que está acontecendo, minha demanda de trabalho anda aumentando muito e…
– Hum, e o que você propõe?
– Uma troca. Isso deixaria minha esposa feliz, e talvez acalmasse um pouco o seu casamento.

No topo de toda a sua sabedoria, Zeus ponderou o fato. Bem, talvez o enxofre ferise um pouco seus pulmões, mas não era nada que um deus não pudesse agüentar. E lembrou-se principalmente de Perséfone, envolta em seus trajes vermelhos e com tantos decotes que cobriam apenas o essencial, que do seu ponto de vista ainda era muito.

– Quando você quer começar mesmo?

Guerra de Tróia – Parte 4

4 out

 E as batalhas tiveram, enfim, continuidade. E um fim.

Heitor, num ímpeto de coragem e força, consegue finalmente invadir o acampamento grego, queimando um dos navios negros. Claro que isso se deu a um grande golpe de sorte – principalmente por haver um barril de querosene para que assim ele pudesse libertar seus instintos incendiários.

Pátroclo, amigo de Aquiles e também grande guerreiro, pede permissão para usar as armas e a armadura deste. Só pra assustar os troianos.

E até que teria sido uma boa idéia. Se Heitor não estivesse por perto, claro. O pobre Pátroclo, diante do maior guerreiro troiano, cai antes mesmo que pudesse dizer: “Ai”. E ainda por cima é despojado das armas emprestadas. Olha só o desmantelo.

Aquiles então, tomado pela fúria, diante do corpo do seu melhor amigo (e aqui entra a dúvida de muitos historiadores, afinal, as tendências homossexuais eram muito comuns entre os gregos), resolve voltar para a guerra. Os troianos, só com a notícia, já ficam com medo. Claro que a carnificina é digna de um quadrinho japonês.

E então Legolas… hum, Páris, o covarde pastor de cabeleira cacheada, com as mãos guiadas por Apolo do Arco de Prata (embora fosse de conhecimento público de fosse um arco de madeira mesmo, porque a prata seria impossível de ser utilizada na fabricação de um arco), acerta Aquiles no calcanhar, matando-o. Tétis, a ninfa-mãe de Aquiles, ao nascimento do filho, banhou-o no rio Estíges, o que o tornaria invulnerável. Contudo, precisou segurar o bebê pelo calcanhar, sendo essa, portanto, a única parte vulnerável do seu corpo.

Claro que todos se perguntam porque ela não segurou o bebê pela outra perna depois, e deixando-o assim completamente invencível. Mais uma daquelas perguntas que ninguém poderá responder.

Aquiles então, padece. E finalmente os gregos ganham a maldita guerra de dez anos. E pilham a cidade, matando os homens e tomando as mulheres como escravas de propósitos escusos (além, claro, dos propósitos mais práticos, como lavar a roupa, cozinhar, entre todos esses detalhes). E depois voltam para suas casas, sendo que a maioria morre no meio do caminho, ou nunca consegue chegar aos seus lares. Coitados.

Guerra de Tróia – Parte 3

4 out

E a guerra continuou, mesmo estando o Melhor dos Gregos fora dela, de bobeira, descansando na sua nau. E claro, obviamente, os gregos começaram a levar uma sova dos troianos. Nesse meio tempo, contudo, várias histórias parecem que foram difundidas. Acredito que isso se deva à falta do que fazer durante as noites de vigília.Foi proposto um combate singular (também conhecido como duelo, para os mais desinformados) entre Menelau, o marido traído, pilhado e desprovido de seu precioso vinho, e Páris, o pastor magricela de cabelos cacheados. Depois disso, a guerra estaria acabada. Resolução essa ótima para ambos os lados – afinal, essa história de guerras longas acaba enchendo o saco.

Dessa vez não havia sequer aquelas rodas de apostas ilegais. No máximo os espectadores tentavam advinhar quanto tempo o pobre Orlando Bloom… er, o pobre pastor duraria sob a lâmina do loiro Menelau.

E o combate teve início, e seu resultado parecia óbvio. Mas eis que, Afrodite, em sua benevolência-mor, arrebatou Páris, segundos antes de sua decapitação, para a tutela de Helena – mais exatamente para a cama de Helena. Obviamente que o senhor de Esparta não aceitou o resultado, e a guerra continuou do mesmo jeito.

Houve ainda o notório combate entre Ajáx e Heitor, este o mais poderoso dos troianos. Ele seria um ótimo protagonista, se não tivessem pago um cachê maior a Brad Pitt, er, a Aquiles. A luta estava acirrada – Ajáx golpeava incansavelmente, enquanto Heitor revidava, aproveitando-se da lentidão de seu adversário. E as horas se passaram. O sol se pôs e nada de terminarem o duelo. Quando a lua já brilhava alta no céu, Heitor embainhou a espada e iniciou o diálogo:

– Acho melhor pararmos por hoje, caro Ajáx. Sabe, sou pai de família, tenho esposa, um filho e ainda um pai velho e doente. Você compreende, não é?
– Perfeitamente. Afinal, eu também estou cansado, e preciso resolver algumas coisas no acampamento grego. Entraves burocráticos, entende?
– Claro, claro. Mas veja só, este foi um combate realmente excelente. Podemos terminá-lo amanhã?
– Ah, mas sem dúvida! Seria um prazer! – respondeu animado Ajáx, desamarrando o escudo que trazia no braço esquerdo – Veja bem, meu caro Heitor, matador de gregos… quero honrá-lo com este presente. Este escudo me foi dado por meu pai, então, é de um enorme valor sentimental para mim. E como sei que você fará bom uso dele…
– Ah, muito obrigado. – e desembainhando novamente o gládio coruscante, Heitor o oferece honrosamente – E, para demonstrar minha gratidão, ofereço-lhe minha espada, forjada com o melhor bronze de toda a Frígia.

E felizes, os combatentes voltaram para seus respectivos assuntos.

Guerra de Tróia – Parte II

4 out

E então anos se passaram, para que reunissem os grandes reis de toda a Grécia. Há muito tempo, antes desta história, esses mesmos reis (a maioria deles com mais cabelos e bem mais tolos e idiotas, evidentemente), tentaram desposar Helena. Tíndaro, que não é bobo nem nada, promoveu um juramento inquebrável: todos eles, em caso de roubo, rapto ou desaparecimento, deveriam unir-se para resgatá-la, independente de quem fosse o escolhido.E o escolhido foi Menelau, rei de Esparta, reino de armas. Pobre coitado.

Deixando o momento flashback pra lá, estavam todos reunidos na ilha de Aulis, esperando o mau tempo passar. Para tanto, foram necessários apenas alguns desentraves burocráticos, como a desonra de uma deusa, um sacrifício da filha do mais poderoso rei da Grécia, e detalhes ínfimos desse tipo. E então, toda a comitiva de incontáveis navios negros partiu para Tróia.

Claro, houveram diversos saques no caminho. E esses não são os de dinheiro – os gregos eram bem mais espertos do que pareciam. Nunca inventariam nada como as instituições bancárias.

O fato é que, num desses saques, uma bela moça foi dada a Agamêmnon, mais poderoso entre os reis gregos. Tal moça chamava-se Criseida. E Crises, humildemente, na sua posição de sacerdote de Apolo, foi comprar sua liberdade. E claro, o que o rei fez? Isso, enxotou o pobre coitado do velho sacerdote.

E o velho sacerdote, assim como qualquer outro velho sacerdote faria, recorreu ao seu velho deus. E seu velho deus, mais conhecido como Apolo, escutou prazerosamente o pedido. E em pessoa (ou seria divindade?) desceu do Olimpo, portando seu arco de prata, e espalhando uma grande praga entre os gregos. O que, claro, teria deixado os troianos bem felizes se o soubessem.

Nove dias de mortes e piras fúnebres se passaram. Aquiles, o mais poderoso entre os guerreiros, com os olhos ardendos e desenvolvendo novos tipos de alergia à fumaça, convocou uma assembléia.

– Vejam bem, é tudo bmuito simples: ou pedibmos para algum profeta que dnos explique o que diabos acodntece, ou sibmplesbmente vabmos embora. BMeu dnariz está bme bmatando.
– Aquiles, você está falando de um jeito tão esquisito… – pergunta um daqueles figurantes que seguram: “Pai, estou na guerra de Tróia!”
– É ridnite alérgica. – explica impaciente o herói.
– Aquiles, filho de uma deusa, eu poderei explicar o que acontece. Claro, se você me proteger de… hum, danos físicos que essas revelações podem me causar. Sabe, não temos realmente uma grande liberdade de expressão por aqui… – respondeu Calcas, advinho famoso, cujo dom diziam ter sido concedido por Apolo.
– Tá… edntedndi. Agabmêmnôn dnão vai tocar em você, dnão se preocupe.
– Toda essa desgraça que nos foi destinada deve-se ao fato de uma escrava, que por acaso é filha de um sacerdote, ter sido negada ao seu pai. E, para compensar, ela deverá ser devolvida com todas as honras, presentes e ainda um sacrifício básico.

Claro, isso tudo causou enorme estardalhaço, e Agamêmnon queria uma compensação. E para tal, escolhe a escrava destinada a Aquiles, Briseida, que, por mera coincidência do destino, era prima de Criseida (apenas uma informação que não terá utilidade alguma para a narrativa, mas que o narrador usa de vez em quando só para mostrar que sabe de alguma coisa). Aquiles, desonrado e puto por não poder fazer nada, vai chorar no colo de sua mãe.

Thétis, por sua vez, apiedada do filho que morreria em breve, foi implorar a Zeus. Hera, obviamente, ficou ardida de ciúmes, mas depois de uma breve discussão tudo ficou bem. Ou quase isso.

Guerra de Tróia – Parte 1

4 out

O dia amanhecia como qualquer outro dia que estivesse fazendo seu trabalho: o sol brilhava, refletido nas margens do rio Xanto, enquanto os pássaros cantavam alegremente, voando por entre os galhos das verdes árvores. Aquele dia trabalhava duro para ser melhor do que os outros, mas de nada adiantava. Seria igual a mais outro dia, assim como diversos outros.

Tempo verbal correto: serIA. Lá estava Páris, tocando sua flauta tranqüilamente, quando deveria estar cuidando dos muitos bois e novilhas que circundavam a região de Tróia. Mas nosso príncipe mal quisto não era assim tão burro – sabia que os bois, que há muito haviam feito um tratado com os humanos da Tróade, ficariam por ali desde que sempre fossem garantidos comida, bebida e mulheres (vacas, nesse caso).

Mas deixemos os bois de lado – eles não são o foco de nossa história hoje. Páris, que tocava sua flauta com a mesma habilidade de um ornintorrinco gripado, surpreende-se com uma visão no mínimo incomum: um sujeito mirrado, que sandálias com asinhas (“Existe cada moda hoje em dia…”, pensava consigo mesmo) pousou na sua frente, com uma expressão no mínimo duvidosa.

– Bem… Péricles… hum, é esse seu nome?
– Não, oh divindade… é Páris.
– Isso! Páris! Bem, o senhor do Olimpo, dono dos trovões, o mais mulherengo de todos, mandou-me aqui para que seja um juiz de um concurso de beleza.
– Concurso de… mas… por que diabos…?

Antes que pudesse reagir de qualquer modo, três deidades femininas apareceram na sua frente. Pasmo, o pobre pastor não sabia onde por os olhos, e mal escutou quando foi instruído para entregar uma maçã de ouro à vencedora.

Atena, que poderia ser conhecida por qualquer coisa exceto por sua delicadeza, foi a primeira a tentar a prática mais comum em qualquer tipo de concurso: o suborno. Prometeu a Páris a vitória nas guerras, e a salvação de sua cidade. Hera, sentindo-se segura por seu posto de esposa do Grande Chefão (e não sendo esse da máfia, cuidado), ignora as guerras e promete ao abobalhado Páris o reinado da Ásia.

Afrodite, muito mais esperta, aproveita-se da sua beleza divina e se mostra em sua versão topless, tão conhecida pelos deuses olímpicos. E, de quebra, oferece a mulher mais bonita entre as mortais: Helena. Sem pensar duas vezes, o franzino príncipe troiano aceita a proposta. E foi até Esparta receber seu prêmio.

Lá chegando, encontra o esposo da referida, que, “coincidentemente”, tem que viajar para Creta. Ocasião melhor não há: bastou a quantidade certa de vinho e pronto. Tem coisas que só Dionisio faz por você. De lá, foram para Tróia, ainda tendo direito a uma paradinha no Egito. Só pra conhecer, sabe? Lua de Mel.

Menelau, puto da vida e com a cabeça bem mais pesada, fez um grande conclave, pois, segundo um juramento feito outrora, em caso de roubo, rapto ou desaparecimento, eles deveriam ligar para… er, se juntar numa missão de resgate.

– Veja bem, Agamênon… *hic* Ele foi lá, roubou minha mulher, roubou meus tesouros e *hic* a minha bebida. Se não fosse a minha bebida, eu nem tinha me importado… mas *hic* ele levou meu melhor vinho!!

E por motivos de difamação e processos legais, estas palavras não foram publicadas por Homero.